Sinval Barroso ingressou em 2001 na Polícia Civil do Amazonas. Ao longo de sua carreira, foi o responsável por diversas delegacias, em Manaus e no interior do Amazonas. Em pouco mais de 15 anos de polícia acumulou experiência e casos que compartilha conosco nessa descontraída conversa para o quadro “Muita História pra Contar”.

ADEPOL-AM: Qual a história mais interessante da sua carreira até aqui?
SINVAL BARROSO: O caso mais interessante foi de um naufrágio, em 2008. Na época era responsável pela Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e saímos de Manaus a noite para chegarmos pela manhã em Boa Vista do Ramos, onde iríamos iniciar uma operação no Baixo Amazonas, que se estenderia também aos municípios próximos. Na madrugada nos deparamos com uma triste situação, de uma balsa que atropelou um barco que acabou naufragando próximo de onde passávamos, chamado Almirante Barroso. O pessoal da balsa fugiu e, como estávamos passando, iniciamos o resgate dos sobreviventes. Conseguimos resgatar aproximadamente 100 pessoas da água, infelizmente outras 16 vieram a falecer.

ADEPOL-AM: Como vocês perceberam o que estava acontecendo?
SB – Vimos a situação porque estava próximo de nós, mas estava escuro. Ambas as embarcações vinham com as luzes de localização apagadas e, apesar de próximo, era uma distância considerável para o nado. Pedimos várias vezes apoio, porém não obtivemos resposta. Nesse momento resolvemos nós mesmo efetuar a salvamento daquelas pessoas. Foi um fato que mudou a vida de todos nós presentes. Deus que nos colocou naquele local, naquele momento.

ADEPOL-AM – E como ocorreu o resgate?
SB – Mergulhamos para ajudar a colocar os sobreviventes na balsa em que estávamos. Durante essa ação cheguei a deslocar minha clavícula, após ficar preso na rede de uma família, que, infelizmente, acabou falecendo. Enquanto eu buscava os sobreviventes na água, os demais colegas iam puxando para cima da balsa e dando os primeiro atendimentos.

ADEPOL-AM – Quantas pessoas participaram dessa salvamento?
SB – Nessa época a DERFV tinha cerca de 60 integrantes, nós devíamos estar em 30 a caminho da operação. Tive que continuar mesmo após deslocar o braço, pois não tinha mais ninguém para ajudar e o próprio barco não tinha coletes nem balsas suficientes. Nós começamos às 4 horas da manhã e só paramos às 16 horas. Tinha gente que, com a correnteza, já havia se afastado quase dois quilômetros, boiando nos aglomerados de mato que se formavam. Pra piorar, havia uma cobra na embarcação que, logo que o barco começou a afundar, foi a primeira a entrar no único bote salva vidas que tinha a disposição. Precisei lutar com a cobra e ainda levei uma mordida na mão. Ainda bem que era novo ná época (risos).
ADEPOL-AM – Foi a atuação mais marcante?
SB – Teve a questão da emoção, da adrenalina do momento. Na delegacia nos focamos muito nas questões legais, a parte fria da lei, burocrática.

ADEPOL-AM – Trabalhar no interior tem muita diferença com a capital?
SB – Tudo era muito novo para mim, porque vinha do Exército Brasileiro, onde era Tenente, e tudo lá dentro é muito voltado para aquele convívio interno, entre os militares. Já na delegacia, você se depara com uma realidade onde as pessoas matam por motivos dos mais fúteis, pais e filhos atentam uns contra os outros… coisas para as quais você não é normalmente criado desde a infância, não costuma ver no seio familiar.

ADEPOL-AM- Por exemplo?
SB – Na inauguração do 18° DIP (Novo Israel), onde tive minha primeira experiência, a expansão demográfica daquela região estava em forma plena, com várias ocupações acontecendo de forma violenta. Após o governador entregar a delegacia, ficamos eu e uma equipe de novatos sozinhos com a realidade onde as pessoas morriam por não ter um cigarro para pagar pedágio.

ADEPOL-AM – Teve algum caso cômico?
SB – Teve um que ocorreu no 3°DIP, um caso de um procedimento de Termo Circunstanciado de Ocorrência que estava sendo realizado. Um amigo da pessoa envolvida chegou dizendo que tinha um dinheiro pra subornar a gente, dois mil reais, e estiquei a conversa pra ver até onde ele ia chegar com essa conversa. Tinha um rapaz que prestava manutenção no ar condicionado e chamei pra contar o dinheiro que estava na mesa, já aproveitando que ele seria testemunha do flagrante pela tentativa de suborno. Quando chegou no final da contagem, o próprio rapaz da manutenção virou pra mim e disse “Dr, esse aqui é tão     pilantra que está querendo lhe enganar, aqui tem apenas R$ 1.900,00”.

ADEPOL-AM – E o interior, tem muito caso interessante?
SB – O interior tem um estilo de vida próprio. É outra realidade. As pessoas chegam na delegacia dizendo que foi “assinar um papel” e você precisa interpretar se é um acordo extrajudicial, algo assim. Teve um exemplo de um rapaz que foi na delegacia pedir para formalizar uma troca envolvendo a convivente dele e o motor rabeta de outro rapaz, alegando que como os dois já tinham um caso, e o outro era compadre dele, preferia “formalizar” o negócio para ninguém fazer confusão. Eles tem uma pureza no coração, de falar na hora o que pensam, até uma certa ingenuidade.

ADEPOL-AM – E o Grupamento de Operações Aéreas, da Polícia Civil?  O senhor fez parte da primeira equipe, como foi essa história?
SB – Tudo começou em 2008, quando junto com o Dr. Arthur, que também é piloto, pensamos em participar do Departamento de Operações Aéreas da Secretaria de Segurança, e o secretário à época abriu processo seletivo interno para os pilotos, mas por algumas situações, acabou virando apenas o Graer da PM. Depois, já na gestão do Dr. Josué Rocha com o Dr. Mário Aufiero na Polícia Civil, conseguimos iniciar as operações com uma nave locada, que nos serviu para atuar em diversas operações de combate às drogas, operação nas eleições, outras conjuntas com o Grupo FERA.

ADEPOL-AM – Como era esse relacionamento interno?
SB – Era muito interessante, éramos quatro pilotos e todos muito amigos. Depois, as coisas foram tomando um novo rumo, e foi quando preferi me afastar do grupamento.