Na verdade, o crime de contrabando se dá quando um produto proibido é importado ou exportado para o país ou fora dele. Há o descaminho durante a existência do fato gerador que justificou a exigência do pagamento de certo tributo. Após a entrada ou a saída do produto no Brasil, e passado um bom tempo, aquele que guardar ou possuir o produto anteriormente contrabandeado cometerá, em tese, o crime de receptação, tipificado no art. 180 do Código Penal.

Esse entendimento se dá por que o individuo ainda mantém sob sua posse e domínio um material oriundo de descumprimento das obrigações tributárias, ou seja, onde os impostos de importação e outros não foram devidamente pagos ou o produto foi inserido ou extraído do território nacional.

É cediço que os crimes de contrabando e descaminho se consumam no momento em que a mercadoria entra ou sai do Brasil. Como é crime formal e instantâneo de efeitos permanentes, sua consumação se dá no momento do transporte da mercadoria para fora ou para dentro do país e, após, por um decurso razoável de tempo, poderá ser investigado, sem o rigor das sanções flagranciais.

O delito de contrabando é crime residual, assim, após sua consumação, outros crimes poderão ser aplicados utilizando o bem contrabandeado, como porte ilegal de arma de fogo, tráfico de drogas, receptação etc.. (Vide STJ, RT 728/511).

Assim, o objeto que entrou no país possui sua natureza jurídica de origem ilegal, o que dá respaldo à conduta ínsita no art. 180 do Código Penal contra aquele que ainda mantém sob sua responsabilidade.

Logo, para existir os crimes de contrabando ou descaminho, o produto-alvo tem que ser novo, pois se for velho, bem usado, poderá afastar a aplicação dos arts. 334 e 334-A, do Código Penal e atrair o preceito primário do art. 180, caput, do Código Penal. Isso ocorre por causa dos elementos subjetivos dos tipos penais do contrabando e descaminho que ventilam os verbos de caráter instantâneo. Já não ocorre o mesmo processo cognitivo para a receptação, o qual se perfaz no transcorrer temporal com a posse da coisa.

A verificação da origem e tempo do produto é muito importante para que o delegado de polícia possa naturalmente emitir um juízo de valor capaz de estabelecer um liame interpretativo do que foi apresentado para a devida apuração e instrução investigatória. Expediente necessário para fomentar uma denúncia apta a perfazer a ação penal.

 

Jurisprudência Classificada

 

“A Quinta Turma desta Corte rmou entendimento no sentido de que o descaminho é crime formal, e não material, razão pela qual o resultado da conduta delituosa relacio- nada ao quantum do imposto devido não integra o tipo legal. Nos termos do art. 334 do Código Penal, o crime de descaminho se perfaz com o ato de iludir o pagamento de imposto devido pela entrada de mercadoria no país. Desnecessária, portanto, a apuração administrativo do montante que deixou de ser recolhido para a configuração do delito. O mesmo raciocínio deve ser aplicado ao delito de contrabando. Precedentes. Decisão que se mantém por seus próprios fundamentos. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no Recurso Especial 1.419.119/PR, Quinta Turma, Rel. Laurita Vaz. j. unânime em 28.3.2014).

 

“A importação ou exportação faz-se através de alfândega, o crime somente estará consumado depois de ter sido a mercadoria liberada pelas autoridades ou transposta a zona.” (STJ, HC 120.586-SP, Rel. Min. Nilson Naves – j. 5.11.2009).

 

“O artigo 334, §1º, alínea ‘d’ do Código Penal pune a receptação de contrabando ou descaminho, no exercício de atividade industrial ou comercial. Em se tratando de ‘receptação’, não há como exigir que as mercadorias sejam novas, mesmo porque não é o tempo de uso da mercadoria que define o tipo objetivo do crime em testilha. O legislador, ao tratar da receptação de produto de contrabando ou descaminho, se reporta, tão-somente, à ‘mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal, ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos’, nada aludindo acerca da condição do estado da mercadoria, se nova ou não. Elementar do tipo penal que diz respeito à qualidade da coisa móvel e apropriável que se usa negociar. A seara adequada para o exame da existência ou não de delito é a criminal, pelo que somente o julgamento proferido no âmbito do processo criminal é que tem o condão de afastar a tipicidade. O ônus da prova, relativamente à alegação de desconhecimento do negócio ilícito, é da defesa. O princípio da insignificância funciona como excludente da tipicidade, dado que, quando aplicado, vem a revelar que, a despeito da conduta se adequar formalmente à norma incriminadora, não há subsunção em relação ao valor ali protegido, tendo em vista a infração ter sido de tal sorte ínfima, que não chegou a afetar o bem jurídico tutelado. Tese da insignificância que se apresenta inaplicável, no caso em apreço, dado o valor das mercadorias apreendidas, na época, estimadas em US$ 3.055,00, a revelar que nesse contexto a lesividade, apesar de não ser vultosa, não pode ser considerada ínfima. Recurso a que se nega provimento.” (TRF-3, ACR 98820/SP – p. 22.10.2002).

 

Legislação Classificada

Descaminho

Art. 334. Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

§ 1º  Incorre na mesma pena quem: (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

I – pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei; (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

II – pratica fato assimilado, em lei especial, a descaminho; (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

III – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem; (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

IV – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos. (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

§  2º Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências. (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

 §  3º A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo, marítimo ou fluvial. (Redação dada pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

Contrabando 

Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida: (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 ( cinco) anos. (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

§  1º Incorre na mesma pena quem: (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

I – pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

II – importa ou exporta clandestinamente mercadoria que dependa de registro, análise ou autorização de órgão público competente; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) 

III – reinsere no território nacional mercadoria brasileira destinada à exportação; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) 

IV – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) 

V – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira. (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

 § 2º – Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências. (Incluído pela Lei nº 4.729, de 14.7.1965)

§ 3º – A pena aplica-se em dobro se o crime de contrabando é praticado em transporte aéreo, marítimo ou fluvial. (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014)

 

Fonte: Delegados.com